Fonte: Veja.com
Especialista da Coppe/UFRJ alerta para a falta de investimento no Muriaé
e no Paraíba do Sul, que deveriam ser administrados pelo governo federal
Dique se rompe e água invade bairro de Três Vendas, em Campos (Gerson Gomes/ Prefeitura de Campos) |
“Minas Gerais não tem controle de seus
problemas ambientais e não comunica o Rio de Janeiro a tempo de tentar
contornar a catástrofe”, diz o coordenador de Defesa Civil do noroeste
fluminense, coronel Douglas Júnior Paulich
As mil famílias do bairro de Três
Vendas, que desde ontem tiveram que deixar suas casas devido ao rompimento de um dique da BR-356, no
município de Campos dos Goytacazes, estão condenadas a enfrentar o mesmo
problema pelos próximos anos, caso a providência seja meramente a de
reconstruir o dique. Para o professor de engenharia civil da Coppe/UFRJ Paulo
Canedo, coordenador do laboratório de hidrologia da universidade, a única forma
de evitar uma nova tragédia é controlar o fluxo do Rio Muriaé ao longo de seu
curso, desde Minas Gerais.
“Os rios Muriaé e Paraíba do Sul
enfrentam o mesmo problema. Não há investimento, e com uma chuva um pouco mais
forte a população fica exposta. São rios de curso longo, que precisam de diques
e barragens ao longo de seu curso”, explica Canedo.
A dificuldade de implementar obras
para administrar a vazão desse tipo de rio, lembra Canedo, está no fato de esses
cursos d’água passarem por mais de um estado. “O Rio Muriaé vem de Minas. A
água que corre no Rio, não é fluminense, é mineira. Por problema de inoperância
ou azar, quem tem o prejuízo é o Rio. Quem paga isso? O governo mineiro não tem
interesse de gastar lá para não inundar o Rio. E o Rio não pode fazer obra em
Minas. Há uma omissão da União, que é quem por lei deve cuidar desses rios”,
analisa.
Três Vendas é um exemplo perfeito de
inoperância. O rompimento do dique não é um
problema novo: ocorreu também em 2007 e 2008, no
mesmo ponto. A responsabilidade sobre a fragilidade daquela obra recai, no
momento, sobre o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit),
do Ministério dos Transportes. Mas é pouco provável que, sozinho, o dique
naquele ponto possa dar conta de todo o problema. Em Três Vendas o nível da
água foi além das dimensões daquele dique. E ainda não há como prever, só
naquele ponto, uma obra para dar conta dos problemas de centenas de quilômetros
rio acima.
Soma-se à falta de investimento no
rio a incapacidade dos governos locais de planejar minimamente a gestão de
riscos. Segundo Paulo Canedo, apesar de não ser possível prever com 100% de
certeza o momento e a intensidade desse tipo de incidente, era sabido, pelo
menos dois dias antes do rompimento, que um volume de água acima do normal
chegaria a Campos – cidade que tem como prefeita a ex-governadora do Rio Rosinha
Garotinho. “O Brasil melhorou muito na qualidade da previsão do tempo. O
problema é que quando a água chega à terra, não somos capazes de transformar os
dados em informação, ou seja, não conseguimos distribuir os dados e transformar
isso em ação. No Rio Muriaé, é possível prever a cheia com dois dias de
antecedência”, alerta Canedo.
Sem comunicação - “Minas Gerais não tem controle de seus problemas ambientais e não
comunica o Rio de Janeiro a tempo de tentar contornar a catástrofe”, diz o
coordenador de Defesa Civil do noroeste fluminense, coronel Douglas Júnior
Paulich. Os métodos para receber informações do estado vizinho acabam sendo os
mais precários- e ineficientes. “Ficamos sabendo que o rio vai aumentar o seu
nível por contatos pessoais que temos com Minas. Lá, é raridade pluviômetro e
rede telemétrica”, explica Paulich.
Mesmo com as informações disponíveis,
as cidades do Norte e do Noroeste foram apanhadas de surpresa. “Pela nossa
previsão, a enchente em Italva era para chegar ao meio-dia de terça-feira. A
enxurrada, no entanto, veio segunda à tarde, perto das 15h. Isso não estava
previsto no sistema de meteorologia. Tanto é que marcamos reunião na segunda
com o secretariado do município para nos prepararmos”, diz o secretário de
Defesa Civil de Italva, Gedeão Bispo de Souza.
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