-Por Merval Pereira – O Globo.com
Além da tentativa
tosca de se apropriar da recente popularidade da seleção brasileira afirmando
que seu governo “é padrão Felipão”, mesmo que não tenha ido ao Maracanã com
receio das vaias, a presidente Dilma continua sem anunciar medida concreta que
dependa diretamente do Executivo para mostrar que compreendeu os anseios das
ruas.
Só a reunião de seu megaministério ontem no Palácio
do Planalto dá a exata noção da burocracia paquidérmica de um governo
paralisado, inoperante. A ideia de realizar um plebiscito para definir reformas
no nosso sistema partidário e eleitoral a ponto de alterar as regras do jogo já
na eleição de 2014, que parecia um grande lance político, começou a subir no
telhado ontem, com uma série de movimentos da própria área governista.
A presidente Dilma, autora da proposta, sublinhou
ontem que fizera apenas “uma sugestão”, pois quem deve definir a essência do
plebiscito e sua viabilidade são o Congresso e o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE). A mensagem que o Palácio do Planalto enviará hoje ao Congresso não
conterá perguntas, mas “sugestões de assuntos e temas”. Entre esses, Dilma
citou o tipo de financiamento em campanha eleitoral e o sistema eleitoral.
Ao mesmo tempo, o PSB do governador Eduardo Campos
sugeriu que o plebiscito seja adiado para outubro do ano que vem, para se
realizar juntamente com as eleições, o que parece mais razoável pelo menos em
termos de organização e logística de uma consulta popular. O problema, porém,
continua do mesmo tamanho, pois a complexidade da reforma política não cabe em
um plebiscito, nem parece ser o melhor instrumento para conseguir a
participação popular fazer com que o povo substitua seus representantes de
maneira direta, em questões complexas como essa.
O referendo seria mais razoável, se se quer legitimar
a reforma política a ser aprovada pelo Congresso, mas o mais importante mesmo é
que deputados e senadores se sintam pressionados pelas ruas para se
reinventarem como representantes do eleitorado.
A ideia da Constituinte exclusiva, que acabou sendo
abandonada e substituída pelo plebiscito, parece ter sido uma tentativa mal
sucedida de emparedar um Congresso que se ressente de apoio popular e levar
adiante uma tentativa de alterar o jogo eleitoral para obter através do sistema
de lista fechada uma representação partidária que dê ao PT e a seus aliados à
esquerda uma hegemonia no Congresso.
O plebiscito foi o que restou para dar início a uma
democracia direta em que o partido no governo pode manipular as consultas até
conseguir alterar o equilíbrio entre os poderes. Provavelmente o recuo do
governo também em relação ao plebiscito deve-se à percepção dos demais
partidos, inclusive os da base governista, de que o PT manobra para ter a
hegemonia do financiamento público de campanha, que vem acoplado à proposta das
listas fechadas. O PMDB é dos partidos que mais bombardeiam o plebiscito.
A presidente Dilma, por seu lado, tem contra si
dentro do PT o movimento para a volta de Lula, que agrada bastante à maioria da
base aliada e até mesmo ao PSB, cujo presidente Eduardo Campos não se
apresentaria como candidato nessa hipótese.
As dificuldades técnicas para a realização do
plebiscito serão analisadas hoje na reunião da Ministra Carmem Lucia,
presidente do TSE, com os presidentes dos TREs, e talvez a solução para o
impasse esteja mesmo na avaliação técnica da questão, sem viés político. A
pressão das ruas não pode justificar nem medidas que coloquem em risco as
finanças do país nem decisões inviáveis.
Até hoje os plebiscitos realizados no país tiveram
pelo menos seis meses para a sua realização, mesmo quando se referiam a apenas
um estado, e o referendo sobre desarmamento levou três meses e meio entre a
convocação e sua realização
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