“Bah! Humbug!”. Essas duas
palavras são imediatamente associadas ao anti-herói fictício e imortal de
Charles Dickens, Ebenezer Scrooge[1]. Scrooge foi o protótipo do Grinch que
roubou o Natal[2], o paradigma de todos os homens céticos.
Todos reconhecemos que Ebenezer
Scrooge era uma pessoa mesquinha — avarenta, insensível, egoísta e cruel. O que
muitas vezes falta em nossa compreensão de seu caráter é que ele era
preeminentemente profano. “Bah! Humbug!”, era o seu uso vitoriano de
profanação.
Não que qualquer editor moderno
sentisse a necessidade de eliminar as profanidades de Scrooge. Sua linguagem
não é o padrão usual de xingamento. Mas era profano que Scrooge ridicularizasse
o que era santo. Ele desdenhava a santidade do Natal. Ele desprezava o que era
sagrado. Ele era cético em relação ao que era sublime.
O Natal é uma data comemorativa,
de fato o feriado mais feliz do mundo. É chamado de um “holiday”
[literalmente, dia santo] porque o dia é sagrado. É um dia em que as empresas
não abrem as portas, as famílias se reúnem, as igrejas estão cheias e os
soldados baixam as suas armas para uma trégua de 24 horas.[3] É um dia
diferente de todos os outros dias.
Cada geração tem a sua abundância
de Scrooges. A igreja está cheia deles. Ouvimos intermináveis
queixas sobre o comercialismo. É dito constantemente para trazermos Cristo de volta ao Natal. Ouvimos dizer que a
tradição de papai noel é um sacrilégio. Ouvimos os que conhecem o rumor da história
que o Natal não é bíblico. “A Igreja inventou o Natal para competir com a
antiga festa romana que homenageava o deus-touro Mitra”, é a objeção dos que se
queixam. “Natal? É uma mera rendição ao paganismo”.
E assim nós desencorajamos a
celebração de Jesus e evitamos firmemente nos envolver na feliz data
comemorativa. Tudo isso é apenas uma dose moderna de Scroogeismo, a
nossa própria profanação hipócrita do que é santo.
É evidente que o Natal é uma
época comercial. As lojas de departamentos ficam totalmente decoradas, as
páginas publicitárias dos jornais crescem e marcamos o número de dias de
compras que faltam até o Natal. Mas, por que todo o comércio? O alto grau de
comércio no Natal é impulsionado por uma coisa: a compra de presentes para
outros. Presentear nossos amigos e familiares não é um vício feio e
desprezível. Isso encarna o amorfo “espírito do Natal”. A tradição repousa, em
última instância, no dom supremo que Deus deu ao mundo. Deus amou o mundo de
tal forma, diz a Bíblia, que deu o seu Filho unigênito. Dar presentes é uma
resposta maravilhosa ao recebimento de tal dom. Pelo menos em um dia do ano nós
provamos a doçura inerente à verdade de que coisa mais bem-aventurada é dar do
que receber.
“Que tal trazer Cristo de volta
ao Natal?”. Isso simplesmente não é necessário. Cristo nunca saiu do Natal. “Bate o Sino” nunca
substituirá “Noite Feliz”. Nosso feriado que uma vez foi conhecido como
Dia de Ação de Graças está rapidamente se tornando conhecido simplesmente como
“Dia do Peru”. Porém o Natal ainda é chamado de Natal. Não é chamado de “Dia do
Presente”. Cristo ainda está no Natal, e por um breve momento um mundo secular
transmite a mensagem de Cristo em cada estação de rádio e canal de televisão na
terra. A igreja nunca recebe tanto tempo disponível para expressar-se quanto
durante a temporada de Natal.
Não apenas a música, mas as artes
visuais estão presentes em abundância, dando testemunho do significado
histórico do nascimento de Jesus. As apresentações de Natal relembram o mundo
da santa encarnação.
“Papai noel não paganiza ou pelo
menos banaliza o Natal? Ele é um mito, e sua própria mitologia lança uma sombra
sobre a séria realidade histórica de Jesus”. De
maneira nenhuma. Mitos não são necessariamente ruins ou prejudiciais. Toda
sociedade cria mitos. Eles são uma forma de arte peculiar inventada geralmente
para transmitir uma mensagem que é considerada importante pelo povo. Quando um
mito é passado como uma história real, isso é fraude. Mas quando serve a um
propósito diferente, pode ser saudável e virtuoso. Papai Noel é um herói
mítico, não um vilão. Ele é pura ficção, mas uma ficção usada para ilustrar uma
verdade gloriosa.
“E as origens históricas do Natal como substituto de uma
festa pagã?”. Só posso dizer: foi bom que os primeiros cristãos tiveram a
sabedoria de fugir de Mitra e direcionar o seu zelo à celebração do nascimento
de Cristo. Quem atualmente associa o Natal a Mitra? Ninguém o chama de “Festa
de Mitra”.
Nós celebramos o Natal porque não
podemos erradicar de nossa consciência a nossa profunda atenção à diferença
entre o sagrado e o profano. O homem, no sentido genérico, tem uma propensão
incurável para delimitar o espaço e o tempo sagrados. Quando Deus apareceu a
Moisés na sarça ardente, o chão que antes era comum de repente tornou-se
incomum. Agora era terra santa, um espaço sagrado. Quando Jacó despertou de sua
visão noturna da presença de Deus, ungiu com azeite a rocha sobre a qual
descansava a sua cabeça. Esse era um lugar santo.
Quando Deus toca a terra, o lugar
é santo. Quando Deus aparece na história, o tempo é santo. Nunca houve um lugar
mais santo do que a cidade de Belém, onde o Verbo se fez carne. Nunca houve um
tempo mais santo do que a manhã de Natal, quando nasceu Emanuel. O Natal é uma
data comemorativa. É a mais santa das datas santas. Devemos prestar atenção ao
alerta de Jacob Marley[4]: “Não seja um Scrooge” no Natal.
#1: Ebenezer Scrooge é a
personagem principal da história “Um Conto de Natal”, de Charles Dickens.
Scrooge mais tarde serviria como inspiração para a criação da personagem “Tio
Patinhas”, de Walt Disney, mais conhecida no Brasil. Scrooge é insensível,
ganancioso, avarento e expressa especial aversão pela época de Natal. ‒ N. T.
#2: Referência ao filme “Como o
Grinch roubou o Natal”, que conta a história um ser verde, o Grinch, que não
suporta a alegria da época natalina. Decidido a acabar com a festa, ele resolve
invadir os lares dos vizinhos e roubar os presentes e enfeites relacionados ao
Natal. ‒ N. T.
#3: Referência à “Trégua de
Natal”, ocorrida nas trincheiras próximas à cidade de Ypres, na
Bélgica, em 24 e 25 de 1914, entre soldados alemães e os seus rivais ingleses e
franceses, durante a 1ª Guerra Mundial. ‒ N. T.
#4: Jacob Marley é um dos
personagens de “Um Conto de Natal”. Ele alerta Scrooge sobre a sua forma
avarenta de viver; o que dentre outros eventos, colobora para a transformação
de Scrooge, que passa a amar o Natal e a ser generoso com os necessitados. Diz-se
que ninguém celebrava o Natal com mais entusiasmo que ele após essa mudança. ‒
N. T.
Por: R.C. Sproul. © Ligonier
Ministries.Website: ligonier.org.
Traduzido com permissão. Fonte: Don’t Be a Scrooge
This Christmas.
Original: Não seja um odiador do
Natal. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br.
Todos os direitos reservados. Tradução: Camila Rebeca Teixeira. Revisão:
William Teixeira.
R. C. Sproul nasceu em 1939, no
estado da Pensilvânia. É ministro presbiteriano, pastor da igreja St. Andrews
Chapel, na Flórida. É fundador e presidente do ministério Ligonier, professor e
palestrante em seminários e conferências, autor de mais de sessenta livros,
vários deles publicados em português, e editor geral da Reformation Study
Bible.
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