"O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética... O que me preocupa é o silêncio dos bons." - Martin Luther King

sábado, 16 de novembro de 2013

Para entender DIREITO – Zé Dirceu é “preso político” ou “POLÍTICO PRESO”???

- Saiu na Folha de hoje (16/11/13)
Dirceu diz ser 'preso político' e critica STF...
"No dia em que se apresentou à Polícia Federal para começar a cumprir pena de prisão, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu divulgou nota na qual se define como um ‘preso político de uma democracia sob pressão das elites’
Dirceu chegou à sede da Superintendência da PF em São Paulo, no bairro da Lapa, por volta das 20h20 de ontem.
O petista diz que pedirá a revisão criminal e apelará às cortes internacionais contra a decisão do Supremo".
A inversão de palavras no título acima não é apenas semântica ou variação gramatical de um mesmo tema. É a diferença entre uma democracia que funciona muito bem e uma ditadura que oprime de forma cruel. 
Nossa Constituição protege a liberdade política através de vários dispositivos. Por exemplo, no artigo 5o ela diz que é inviolável a liberdade de consciência. Consciência não é só a crença religiosa, mas a crença em qualquer valor, inclusive políticos, doutrinários e filosóficos. E ela protege não só nosso direito de consciência, mas também o direito de nos exprimirmos sobre esses valores, ao dizer que “é livre a manifestação de pensamento”.
Em seu primeiro artigo a Constituição diz que um dos cinco valores fundamentais de nossa República é a pluralidade política. No artigo 4o, ela diz que em nossas relações internacionais, um de nossos princípios é a concessão de asilo internacional. Asilo é concedido especialmente para perseguidos políticos (e não para meros políticos perseguidos). No artigo 5o, ela diz que “não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião”.
E assim vai. Há inúmeros outros dispositivos na Constituição protegem nossa liberdade política. Logo, não pode haver preso político no Brasil.
Por outro lado, nossa Constituição diz no mesmo artigo 5o que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.
A Constituição não diz que ‘todos temos os mesmos direitos’ ou que ‘todos temos as mesmas obrigações’ justamente para evitar que alguém alegasse que tem um direito mas não tem uma obrigação. Se todos somos iguais, não importa se somos políticos ou mendigos, devemos carregar os mesmos direitos e as mesmas obrigações “sem distinção de qualquer natureza”.
Em uma sociedade em formação, onde o apelo de adjetivos como ‘diferenciado’, ‘top’, ‘vip’ e ‘exclusivo’ ainda tem tanto apelo porque queremos nos achar melhores do que nossos pares, o “sem distinção” estabelecido pela Constituição é importante. Não é porque ocupamos determinado cargo, fomos eleitos por determinado número de pessoas ou mantemos relações com pessoas de determinado partido ou classe social que temos carta branca para agir fora da lei. A Justiça deve tratar todos “sem distinção”. Inclusive políticos. 
Daí não fazer sentido a frase “preso político de uma democracia”. Ou é uma democracia ou há preso político. Não há democracia com preso político.
Aung San Suu Kyi, em Myanmar/Burma; Nelson Mandela, na África do Sul; e Mahatma Gandhi na Índia, são exemplos clássicos de presos políticos em ditaduras. Chris Huhne, no Reino Unido, e Jesse Jackson Jr, nos EUA, são exemplos de políticos presos em democracias que funcionam bem.
Os exemplos deixam claro que todo preso político é também um político preso, mas nem todo político preso é um prisioneiro político.
PS: Já falamos sobre ‘apelações’ feitas às ‘cortes internacionais’ aqui, mas vale lembrar: do ponto de vista retórico, pode funcionar, mas do ponto de vista jurídico, tais cortes não têm qualquer relevância porque (a) não têm jurisdição sobre o território nacional e (b) o Brasil é soberano em suas relações internacionais e, logo, o Judiciário brasileiro não está submetido a tais cortes.

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