A reencarnação surgiu no norte da
Índia entre os anos 1.000 e 600 antes de Cristo, exatamente na época em que
Davi e seus descendentes governavam Israel até a queda de Jerusalém.
A primeira referência à idéia de
reencarnação tem no mínimo 2.600 anos. Aparece nas Upanichades, as escrituras
sagradas do hinduísmo, até hoje a maior religião da Índia.
Como o hinduísmo é o grande
progenitor das chamadas religiões orientais e de outras nascidas no Ocidente,
essas religiões se incumbiram de repassar por todo o mundo a teoria de que a
alma habita diversos e diferentes corpos através dos séculos e em vários
mundos.
No século 6 antes de Cristo, duas
novas religiões foram organizadas na Índia, ambas egressas do hinduísmo e ainda
existentes. A primeira é o jainismo, fundado pelo príncipe indiano Nataputa
Vardamana (cerca de 599 a 537 a.C.). A segunda é o budismo, fundado por
Siddharta Gautama, mais conhecido como o Buda (563-483 a.C.). A maior preocupação
de Vardamana e de Gautama, mais ou menos contemporâneos dos profetas bíblicos
Ageu, Zacarias e Malaquias, era como atravessar o “rio” que separa a samsara (o
ciclo interminável de renascimentos) do moksha (a soltura ou a libertação
final).
Neste mesmo século, o filósofo e
matemático grego Pitágoras, nascido por volta do ano 580 a.C., dizia que a alma
era imortal e, depois da morte do corpo, ela ocupava outro corpo, às vezes, de
um animal. Daí a palavra metempsicose, de origem grega, que significa
transmigração. O quanto se saiba, é a primeira vez que a teoria da reencarnação
foi mencionada no Ocidente.
No século seguinte (5), Platão, outro
filósofo grego, nascido lá pelo ano 427 a.C., ensinava que a alma nasce muitas
vezes, até mesmo durante 10 mil anos, e, depois, parte para a bem-aventurança
celestial.
Mais de 600 anos depois da morte de
Platão (347 a.C.), alguns monges começaram a pregar a restauração final de
todos os seres, até mesmo o diabo e seus anjos, por meio de um processo de
purificação, que incluía a reencarnação. Essa corrente teológica, conhecida
como origenismo, foi progressivamente refutada, condenada e eliminada na
primeira metade do sexto século.
Foram necessários mais de 1.600 anos
para a reencarnação receber dois de seus maiores impulsos modernos. O primeiro
se deu na França por meio de um médico de excelente formação acadêmica chamado
Hippolyte Léon Denizad Rivail (1804-1869), que adotou o nome de Allan Kardec,
de quem se dizia reencarnação. Com a publicação do primeiro de seus sete livros
(O Livro dos Espíritos), em abril de 1857, Kardec deu início a uma nova
religião, conhecida como espiritismo (mais preciso que o espiritualismo,
nascido um pouco antes nos Estados Unidos) ou kardecismo, que se desenvolveu
muito mais no Brasil do que na Europa. O segundo grande impulso nasceu nos
Estados Unidos 18 anos depois, em 1875, graças ao esforço conjunto da ucraniana
Helena Petrovna Blavatsky (1831-1891) e do americano Henry Steel Olcott
(1832-1907). Os dois fundaram em Nova York a Sociedade Teosófica, mais tarde
transferida para Adyar, na Índia. Em seu livro A Doutrina Secreta, Blavatsky
afirma que “a doutrina básica da filosofia esotérica não admite privilégios ou
dons especiais no homem, exceto os conquistados pelo seu ego, através do
esforço pessoal e mérito, mediante uma longa série de metempsicoses e
reencarnações”. Especialmente com Kardec, a doutrina da reencarnação passou a
ser difundida com grande ímpeto.
No final do século 19, aportou nos
Estados Unidos a primeira seita hindu, por instrumentalidade do eloqüente
professor indiano Swami Vivekananda (1863-1902). Depois de ter feito uma
calorosa conferência no Parlamento das Religiões Mundiais, realizado em
Chicago, Vivekananda fundou em Nova York, no ano de 1895, a Sociedade Vedana,
cuja ênfase naturalmente era a reencarnação.
Um século depois da “invasão” do
cristianismo no Oriente, começou a “invasão” das religiões orientais no
Ocidente. É curioso observar que o primeiro missionário protestante das missões
modernas, o inglês William Carey, chegou à Índia em 1793, com a idade de 32
anos. O professor indiano que fundou a Sociedade Vedana chegou aos Estados
Unidos exatamente 100 anos depois, em 1893, com a mesma idade de Carey (32
anos). Carey pregava o perdão de pecados mediante o sacrifício vicário de Jesus
Cristo e Vivekananda pregava o contrário: todo mal cometido será reparado com
expiações pessoais nesta e em novas e difíceis encarnações.
Além do hinduísmo (não se sabe quando
começou), do jainismo e do budismo (século sexto antes de Cristo), do
rosacrucianismo (século 14), do sikhismo (século 15), do espiritismo e do
teosofismo (século 19) — religiões que pregam a doutrina da pluralidade de
existências — o século 20 marcou o surgimento e a expansão de várias outras
religiões reencarnacionistas, que pretendem fechar o cerco contra as boas novas
(significado de evangelho) de que nos nasceu “o Salvador, que é Cristo, o
Senhor” (Lc 2.11).
Começou com o racionalismo cristão,
fundado aqui no Brasil em 1910, pelo português Luiz de Mattos (1860-1926), para
quem o perdão de pecados significa comodismo.
Depois vieram a antroposofia, uma
dissidência alemã da teosofia (1913); a conhecida Seicho-no-ie, fundada no
Japão em 1930 por Masaharu Taniguchi (1893-1985); a Igreja Messiânica Mundial,
fundada também no Japão em 1935 por Mokiti Okada (1882-1955); a brasileira
Legião da Boa Vontade, fundada no Rio de Janeiro em 1950, por Alziro Elias
David Abraão Zarur (1914-1979), que se dizia reencarnação de Allan Kardec; a
cientologia, fundada em Washington em 1955, por Lafayette Ron Hubbard
(1911-1986); a meditação transcendental, uma ramificação do hinduísmo, fundada
pelo indiano Maharish Mahesh Yogi, hoje com 90 anos, e trazida para a América
em 1958; a Igreja Internacional da Sabedoria Eterna, fundada pela ex-pastora
episcopal Beth R. Hand (1903-1977) em 1962 na Filadélfia; e o Hare Krishna
(Sociedade Internacional para Consciência de Krishna), levada para os Estados
Unidos em 1965 pelo indiano Blaktivedanta Swami Prabhupada (1896-1977).
Unindo e cobrindo essas religiões
todas e outros movimentos esotéricos que misturam cultos, crenças e
superstições, existe um guarda-chuva quase do tamanho da camada de ozônio. É a
propalada Nova Era (New Age), também chamada de Nova Consciência Cósmica. A
Nova Era não é mais uma seita, mas uma constelação delas, como avisa Hélio
Damante. Fazem parte desse conjunto a astrologia, a numerologia, o tarô e o I
Ching (técnica chinesa do século 12 antes de Cristo que promete revelar ao
homem modelos de comportamento reto e bem-sucedido), bem como as viagens
cósmicas, as viagens mentais ao passado e os contatos com extraterrestres. A
Nova Era começou a tomar forma na década de 1970. É uma espécie de meta-rede de
organizações autônomas, embora unidas. Compete abertamente com a herança
judaico-cristã. Na verdade, a Nova Era nada mais é do que velhas idéias
apresentadas com um vocabulário atualizado e mais sofisticado, como explica
Larry Nichols. Entre essas velhas idéias está, é claro, a doutrina
originalmente hindu da reencarnação.
O Brasil é o berço não só do
racionalismo cristão e da Legião da Boa Vontade, mas também do chamado Vale do
Amanhecer, fundado pela sergipana Neiva Chaves Zelaya (1925-1985), mais
conhecida como Tia Neiva, em 1957, perto de Brasília. Embora se declare ciência
pura, alegadamente recebida via mediunidade, o Vale do Amanhecer é, como quase
todas as religiões reencarnacionistas, uma mescla de cristianismo, espiritismo,
ufologia, esoterismo e ocultismo.
Dos cultos afro-brasileiros, a
umbanda é o que mais reflete a influência do espiritismo kardecista. Ela
acredita no carma e na reencarnação.
Os pesquisadores americanos George
Mather e Larry Nichols afirmam que as seitas Meninos de Deus e Templo do Povo,
fundadas respectivamente por Moisés David (1919-1995) e Jim Jones (1931-1978),
ambas nos Estados Unidos, adotam a doutrina da reencarnação. (Talvez isso tenha
facilitado o suicídio coletivo de 913 seguidores de Jim Jones, na Guiana, em
1978.)
O mais grave, porém, é que, além dos
espíritas assumidos, há milhões de brasileiros que se declaram católicos e
espíritas ao mesmo tempo, quando na teoria e na prática, isso é impossível
porque são doutrinas antagônicas. Tal aberração levou a 3ª Conferência Geral do
Episcopado Latino-Americano, reunida em Puebla de los Angeles, no México, de 28
de janeiro a 13 de fevereiro de 1979, a recomendar que se inclua nos catecismos
“um capítulo especial sobre espiritismo e o mandamento divino que proíbe as
superstições, a magia e a invocação dos mortos e dos espíritos”. Além disso, a
mesma conferência sugeriu que “nas paróquias particularmente infestadas pelo
espiritismo”, os sacerdotes “falem dele [do espiritismo] aos fiéis, com
caridade mas claramente, explicando a impossibilidade de continuar sendo
católicos aderindo-se ao espiritismo”.
Porque cada crente possui uma Bíblia,
é estimulado a lê-la e costuma freqüentar a Escola Dominical, onde se estuda a
Palavra de Deus, e os cultos, esse problema é bem menor entre os evangélicos.
Todavia, com o relaxamento doutrinário atual, com a preocupação demasiada em
quantidade de membros e não na qualidade, e com o anúncio de um evangelho fácil
sem porta estreita e com muitas promessas de bênçãos temporais e seculares — é
certo que os evangélicos vão enfrentar sérios problemas de doutrina e de
comportamento. Já há protestantes ditos espíritas. Um deles é Nehemias Marien,
ex-pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil.
A impiedade da reencarnação
A reencarnação é uma tremenda
maldade. Ela transfere a solução de um problema crucial para um futuro
longínquo e impreciso. A realização final depende de um número desconhecido de
renascimentos. Fala-se em “muitas vidas”, em “inúmeras reencarnações” e até em
“milhões de renascimentos”. A palavra milhão indica um número altíssimo e, além
disso, está no plural. Cada reencarnação traz novo sofrimento e mais uma
experiência dolorosa de doença e morte. Daí a palavra do próprio Buda: “Eu
passei pelo curso de muitos nascimentos procurando o construtor dessa morada e
não o encontrei; dor é renascer uma vez após outra”.1
Sofre-se sem saber precisamente o
porquê. Pagam-se os erros das encarnações anteriores sem saber quais foram.
A maldade da reencarnação está
contida nesta canção popular indiana:
“Quantos nascimentos já passaram, não
posso contar/ Quantos ainda estão para vir, nenhum homem pode dizer/ Mas sei
somente isto e o sei muito bem:/ Que a dor e a tristeza amargam todo o
caminho”.2
1 Citado
por John Bowker, em Para Entender as Religiões, p. 61 (Editora Ática, 1997).
2 Citado por Larry A. Nichols, em Dicionário de
Religiões, Crenças e Ocultismo, p. 186 (Editora Vida, 2000).
Fonte: Ultimato
Maio/Junho-2001
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