"O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética... O que me preocupa é o silêncio dos bons." - Martin Luther King

quarta-feira, 29 de maio de 2013

A longa história da reencarnação

A reencarnação surgiu no norte da Índia entre os anos 1.000 e 600 antes de Cristo, exatamente na época em que Davi e seus descendentes governavam Israel até a queda de Jerusalém.
A primeira referência à idéia de reencarnação tem no mínimo 2.600 anos. Aparece nas Upanichades, as escrituras sagradas do hinduísmo, até hoje a maior religião da Índia.
Como o hinduísmo é o grande progenitor das chamadas religiões orientais e de outras nascidas no Ocidente, essas religiões se incumbiram de repassar por todo o mundo a teoria de que a alma habita diversos e diferentes corpos através dos séculos e em vários mundos.
No século 6 antes de Cristo, duas novas religiões foram organizadas na Índia, ambas egressas do hinduísmo e ainda existentes. A primeira é o jainismo, fundado pelo príncipe indiano Nataputa Vardamana (cerca de 599 a 537 a.C.). A segunda é o budismo, fundado por Siddharta Gautama, mais conhecido como o Buda (563-483 a.C.). A maior preocupação de Vardamana e de Gautama, mais ou menos contemporâneos dos profetas bíblicos Ageu, Zacarias e Malaquias, era como atravessar o “rio” que separa a samsara (o ciclo interminável de renascimentos) do moksha (a soltura ou a libertação final).
Neste mesmo século, o filósofo e matemático grego Pitágoras, nascido por volta do ano 580 a.C., dizia que a alma era imortal e, depois da morte do corpo, ela ocupava outro corpo, às vezes, de um animal. Daí a palavra metempsicose, de origem grega, que significa transmigração. O quanto se saiba, é a primeira vez que a teoria da reencarnação foi mencionada no Ocidente.
No século seguinte (5), Platão, outro filósofo grego, nascido lá pelo ano 427 a.C., ensinava que a alma nasce muitas vezes, até mesmo durante 10 mil anos, e, depois, parte para a bem-aventurança celestial.
Mais de 600 anos depois da morte de Platão (347 a.C.), alguns monges começaram a pregar a restauração final de todos os seres, até mesmo o diabo e seus anjos, por meio de um processo de purificação, que incluía a reencarnação. Essa corrente teológica, conhecida como origenismo, foi progressivamente refutada, condenada e eliminada na primeira metade do sexto século.
Foram necessários mais de 1.600 anos para a reencarnação receber dois de seus maiores impulsos modernos. O primeiro se deu na França por meio de um médico de excelente formação acadêmica chamado Hippolyte Léon Denizad Rivail (1804-1869), que adotou o nome de Allan Kardec, de quem se dizia reencarnação. Com a publicação do primeiro de seus sete livros (O Livro dos Espíritos), em abril de 1857, Kardec deu início a uma nova religião, conhecida como espiritismo (mais preciso que o espiritualismo, nascido um pouco antes nos Estados Unidos) ou kardecismo, que se desenvolveu muito mais no Brasil do que na Europa. O segundo grande impulso nasceu nos Estados Unidos 18 anos depois, em 1875, graças ao esforço conjunto da ucraniana Helena Petrovna Blavatsky (1831-1891) e do americano Henry Steel Olcott (1832-1907). Os dois fundaram em Nova York a Sociedade Teosófica, mais tarde transferida para Adyar, na Índia. Em seu livro A Doutrina Secreta, Blavatsky afirma que “a doutrina básica da filosofia esotérica não admite privilégios ou dons especiais no homem, exceto os conquistados pelo seu ego, através do esforço pessoal e mérito, mediante uma longa série de metempsicoses e reencarnações”. Especialmente com Kardec, a doutrina da reencarnação passou a ser difundida com grande ímpeto.
No final do século 19, aportou nos Estados Unidos a primeira seita hindu, por instrumentalidade do eloqüente professor indiano Swami Vivekananda (1863-1902). Depois de ter feito uma calorosa conferência no Parlamento das Religiões Mundiais, realizado em Chicago, Vivekananda fundou em Nova York, no ano de 1895, a Sociedade Vedana, cuja ênfase naturalmente era a reencarnação.
Um século depois da “invasão” do cristianismo no Oriente, começou a “invasão” das religiões orientais no Ocidente. É curioso observar que o primeiro missionário protestante das missões modernas, o inglês William Carey, chegou à Índia em 1793, com a idade de 32 anos. O professor indiano que fundou a Sociedade Vedana chegou aos Estados Unidos exatamente 100 anos depois, em 1893, com a mesma idade de Carey (32 anos). Carey pregava o perdão de pecados mediante o sacrifício vicário de Jesus Cristo e Vivekananda pregava o contrário: todo mal cometido será reparado com expiações pessoais nesta e em novas e difíceis encarnações.
Além do hinduísmo (não se sabe quando começou), do jainismo e do budismo (século sexto antes de Cristo), do rosacrucianismo (século 14), do sikhismo (século 15), do espiritismo e do teosofismo (século 19) — religiões que pregam a doutrina da pluralidade de existências — o século 20 marcou o surgimento e a expansão de várias outras religiões reencarnacionistas, que pretendem fechar o cerco contra as boas novas (significado de evangelho) de que nos nasceu “o Salvador, que é Cristo, o Senhor” (Lc 2.11).
Começou com o racionalismo cristão, fundado aqui no Brasil em 1910, pelo português Luiz de Mattos (1860-1926), para quem o perdão de pecados significa comodismo.
Depois vieram a antroposofia, uma dissidência alemã da teosofia (1913); a conhecida Seicho-no-ie, fundada no Japão em 1930 por Masaharu Taniguchi (1893-1985); a Igreja Messiânica Mundial, fundada também no Japão em 1935 por Mokiti Okada (1882-1955); a brasileira Legião da Boa Vontade, fundada no Rio de Janeiro em 1950, por Alziro Elias David Abraão Zarur (1914-1979), que se dizia reencarnação de Allan Kardec; a cientologia, fundada em Washington em 1955, por Lafayette Ron Hubbard (1911-1986); a meditação transcendental, uma ramificação do hinduísmo, fundada pelo indiano Maharish Mahesh Yogi, hoje com 90 anos, e trazida para a América em 1958; a Igreja Internacional da Sabedoria Eterna, fundada pela ex-pastora episcopal Beth R. Hand (1903-1977) em 1962 na Filadélfia; e o Hare Krishna (Sociedade Internacional para Consciência de Krishna), levada para os Estados Unidos em 1965 pelo indiano Blaktivedanta Swami Prabhupada (1896-1977).
Unindo e cobrindo essas religiões todas e outros movimentos esotéricos que misturam cultos, crenças e superstições, existe um guarda-chuva quase do tamanho da camada de ozônio. É a propalada Nova Era (New Age), também chamada de Nova Consciência Cósmica. A Nova Era não é mais uma seita, mas uma constelação delas, como avisa Hélio Damante. Fazem parte desse conjunto a astrologia, a numerologia, o tarô e o I Ching (técnica chinesa do século 12 antes de Cristo que promete revelar ao homem modelos de comportamento reto e bem-sucedido), bem como as viagens cósmicas, as viagens mentais ao passado e os contatos com extraterrestres. A Nova Era começou a tomar forma na década de 1970. É uma espécie de meta-rede de organizações autônomas, embora unidas. Compete abertamente com a herança judaico-cristã. Na verdade, a Nova Era nada mais é do que velhas idéias apresentadas com um vocabulário atualizado e mais sofisticado, como explica Larry Nichols. Entre essas velhas idéias está, é claro, a doutrina originalmente hindu da reencarnação.
O Brasil é o berço não só do racionalismo cristão e da Legião da Boa Vontade, mas também do chamado Vale do Amanhecer, fundado pela sergipana Neiva Chaves Zelaya (1925-1985), mais conhecida como Tia Neiva, em 1957, perto de Brasília. Embora se declare ciência pura, alegadamente recebida via mediunidade, o Vale do Amanhecer é, como quase todas as religiões reencarnacionistas, uma mescla de cristianismo, espiritismo, ufologia, esoterismo e ocultismo.
Dos cultos afro-brasileiros, a umbanda é o que mais reflete a influência do espiritismo kardecista. Ela acredita no carma e na reencarnação.
Os pesquisadores americanos George Mather e Larry Nichols afirmam que as seitas Meninos de Deus e Templo do Povo, fundadas respectivamente por Moisés David (1919-1995) e Jim Jones (1931-1978), ambas nos Estados Unidos, adotam a doutrina da reencarnação. (Talvez isso tenha facilitado o suicídio coletivo de 913 seguidores de Jim Jones, na Guiana, em 1978.)
O mais grave, porém, é que, além dos espíritas assumidos, há milhões de brasileiros que se declaram católicos e espíritas ao mesmo tempo, quando na teoria e na prática, isso é impossível porque são doutrinas antagônicas. Tal aberração levou a 3ª Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, reunida em Puebla de los Angeles, no México, de 28 de janeiro a 13 de fevereiro de 1979, a recomendar que se inclua nos catecismos “um capítulo especial sobre espiritismo e o mandamento divino que proíbe as superstições, a magia e a invocação dos mortos e dos espíritos”. Além disso, a mesma conferência sugeriu que “nas paróquias particularmente infestadas pelo espiritismo”, os sacerdotes “falem dele [do espiritismo] aos fiéis, com caridade mas claramente, explicando a impossibilidade de continuar sendo católicos aderindo-se ao espiritismo”.
Porque cada crente possui uma Bíblia, é estimulado a lê-la e costuma freqüentar a Escola Dominical, onde se estuda a Palavra de Deus, e os cultos, esse problema é bem menor entre os evangélicos. Todavia, com o relaxamento doutrinário atual, com a preocupação demasiada em quantidade de membros e não na qualidade, e com o anúncio de um evangelho fácil sem porta estreita e com muitas promessas de bênçãos temporais e seculares — é certo que os evangélicos vão enfrentar sérios problemas de doutrina e de comportamento. Já há protestantes ditos espíritas. Um deles é Nehemias Marien, ex-pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil.

A impiedade da reencarnação
A reencarnação é uma tremenda maldade. Ela transfere a solução de um problema crucial para um futuro longínquo e impreciso. A realização final depende de um número desconhecido de renascimentos. Fala-se em “muitas vidas”, em “inúmeras reencarnações” e até em “milhões de renascimentos”. A palavra milhão indica um número altíssimo e, além disso, está no plural. Cada reencarnação traz novo sofrimento e mais uma experiência dolorosa de doença e morte. Daí a palavra do próprio Buda: “Eu passei pelo curso de muitos nascimentos procurando o construtor dessa morada e não o encontrei; dor é renascer uma vez após outra”.1 
Sofre-se sem saber precisamente o porquê. Pagam-se os erros das encarnações anteriores sem saber quais foram.
A maldade da reencarnação está contida nesta canção popular indiana:
“Quantos nascimentos já passaram, não posso contar/ Quantos ainda estão para vir, nenhum homem pode dizer/ Mas sei somente isto e o sei muito bem:/ Que a dor e a tristeza amargam todo o caminho”.2

1 Citado por John Bowker, em Para Entender as Religiões, p. 61 (Editora Ática, 1997).
Citado por Larry A. Nichols, em Dicionário de Religiões, Crenças e Ocultismo, p. 186 (Editora Vida, 2000).
Fonte: Ultimato Maio/Junho-2001

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